[Cobertura] The Gathering oferece momentos de transcendência espiritual com apresentação mágica no Manifesto Bar

The Gathering

Manifesto Bar
28 de setembro de 2022
São Paulo/PR

Por Clovis Roman
Fotos: Gustavo Diakov (@xchicanox)

Um dos grandes expoentes da música dos anos 1990, o grupo holandês The Gathering retornou ao Brasil para duas apresentações, sendo uma delas no palco do conceituado Manifesto Bar, em São Paulo. O grupo veio com a AutoReverse: 30th Anniversary America Tour 2022, que celebra as mais de três décadas de estrada da banda, ao mesmo tempo que divulga o mais recente álbum, o estupendo Beautiful Distortion. Portanto, o setlist revisitou o passado sem esquecer o momento atual da banda.

A casa recebeu um público bastante empolgado, que presenciou os músicos subindo ao palco sem maiores cerimônias, logo começando a apresentação, pontualmente às 21h30, com “Stronger”, do mais recente EP, Interference, seguindo com “In Colour”, com andamento moderado e linhas vocais espetaculares de Silje Wergeland. Esta, do álbum Beautiful Distortion, fez bonito ao anteceder dois clássicos supremos.

As duas faixas iniciais prepararam o terreno para a catarse coletiva gerada com “Leaves”, uma das mais icônicas obras do conjunto, oriunda do masterpiece Mandylion (1995). Novamente Silje brilhou com uma interpretação intensa, algo amplificado ainda mais com “Strange Machines”, do mesmo álbum. O que o The Gathering criou com este trabalho passou no teste do tempo e se tornou um marco musical daquela década. Em outros álbuns, e com outras abordagens, eles sempre foram criativos e inovadores, porém Mandylion marcou toda uma geração.

The Gathering em ação no Manifesto Bar, em São Paulo (foto: Gustavo Diakov).

Voltando ao presente, após rápida interação com a plateia, o single contemporâneo “We Rise” trouxe novamente a faceta atual da banda, com uma intro na guitarra sugerindo algo mais ríspido, porém logo as linhas vocais e o restante do instrumental moldam a densa canção, com partes de energia moderada e admiráveis passagens atmosféricas.

Em “Probably Built In The Fifties”, a pegada eletrônica tomou a frente em um som suave oriundo de outro grande trabalho do grupo, o magnânimo How to Measure a Planet? (1998). Um “thank you gathering” surgiu do público em direção ao palco, logo respondido pela vocalista: “Obrigada, São Paulo”, em português mesmo. O clima era, de fato, acolhedor.

O repertório foi muito homogêneo, pois musicalmente músicas antigas e novas se mesclaram perfeitamente. Claro que a resposta do público foi mais ruidosa em clássicos como os mencionados antes, ou em “Saturnine”, o ápice do êxtase dos fãs, com direito a coro uníssono nas melodias finais. No decorrer do setlist, cada músico imprimia sua característica, como o baterista Hans Rutten, minimalista, econômico e repleto de feeling (sua performance tênue em Heroes for Ghosts, com baqueta vassourinha, foi um belo exemplo), cuja pegada casava perfeitamente com Hugo Prinsen Geerligs, baixista pulsante e discreto.

René Rutten, do The Gathering, no Manifesto Bar (foto: Gustavo Diakov).

Entretanto, o grande destaque foi o irmão de Hans, René Rutten, que reproduzia sonoridades absurdas de guitarra, camadas e representações de sentimentos variados em forma de sons celestiais. Mesmo no canto mais escuro do palco, ele foi o que mais brilhou, esbanjando simplicidade em prol de algo grandioso. Em uma apresentação irrepreensível, ainda tivemos “Pulse of Life”, a solitária representante do assombroso Nighttime Birds, “On Most Surfaces (Inuït)” e “Sand & Mercury”, outra do Mandylion, na qual Silje saiu do palco logo nos primeiros acordes, retornando apenas na parte psicodélica no meio, que desembocou em meio a um slide-guitar, em um encerramento bastante doom metal.

O setlist inicialmente traria “Weightless” no meio do repertório, mas os músicos trocaram-na de lugar pouco antes de subirem ao palco. Abrindo o encore, a canção cintilou timidamente em direção a explosão luminosa com a enigmática “Great Ocean Road”, mais uma do lendário How to Measure a Planet?, e ainda mais em “I Can See Four Miles”, do penúltimo álbum Disclosure (2012). Aqui, jazz, progressivo, doom, post-rock e um ar livre guiam uma música extensa, que passeia sem pressa de chegar ao destino, indo do delicado ao agressivo, do ruidoso ao sublime, com o auxílio de muitas paredes sonoras e até mesmo de um theremin em uma longa sessão instrumental.

Após esta experiência única proporcionada pelos cinco integrantes do The Gathering, eles ainda atenderam o pessoal nas dependências do Manifesto Bar, transitando livremente, sem mesas ou barreiras dividindo artistas e fãs. Noite memorável.

Repertório:

Stronger
In Colour
Leaves
Strange Machines
We Rise
Probably Built in the Fifties
Pulse of Life
Heroes for Ghosts
On Most Surfaces (Inuït)
Saturnine
Sand & Mercury
Weightless
Great Ocean Road
I Can See Four Miles

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