Fear Factory
06 de junho de 2023
Fabrique
São Paulo/SP
por Clovis Roman
A atual fase do Fear Factory pode ter suscitado dúvidas dos fãs. Afinal, o lendário e vocalista desde sempre, Burton C. Bell, deixou o grupo após trinta anos e dez discos de estúdio. O anúncio do desconhecido Milo Silvestro deixou a galera apreensiva, porém, assim que os primeiros vídeos surgiram na internet após o primeiro show, muitos se empolgaram. Com este sentimento, rumamos até São Paulo para verificar se há vida após Burton. Há!

O show do fear Factory em São Paulo integrou a The Machine Will Rise Tour, que passou pela América Latina e México. Milo foi o grande destaque. Primeiramente, a expectativa em relação aos seus vocais foi plenamente suprida quase que de imediato. Sua voz soa como um Burton C. Bell mais forte e afinado, mas ainda tem certa identidade. Outro fator é a presença e domínio do palco e do público. Na abertura com “Shock”, já mandou um ‘todo mundo’, invocando a galera a cantar o refrão. Foi atendido com fervor. Antes da brutal “Powershifter”, deu uma cutucada que surtiu efeito: “Vocês quase estão superando o público do México. Continuem fazendo o seu melhor”. No decorrer da noite, interagiu ainda mais com os fãs e mostrou muita energia – mesmo quando parecia disperso, imerso na música. Uma das melhores substituições de vocalistas da história do metal.

Regendo a orquestra, Dino Cazares foi uma máquina mortífera de riffs pesados, alicerçado pela competente cozinha de Tony Campos (baixo) e o novato Pete Webber (bateria) com sua performance correta. No repertório, um passeio por toda a discografia, ficando de fora apenas o fraquíssimo Transgression, que não contou com Cazares nem nenhum outro músico no palco esta noite. Curiosamente, uma outra música, a faixa título de Archetype (2005), que também não teve nenhum dos músicos da atual formação, foi um dos momentos de maior catarse coletiva. “Archetype”, assim que anunciada por Silvestro, causou um caos na pista do Fabrique. A repetição excessiva do singelo verso “open your eyes” nos momentos finais criou um coro que certamente foi ouvido a quadras de distância da casa de shows. Sublime.

Mesmo quando vemos nossas bandas favoritas ao vivo, sempre tem aquela música que a gente tiraria para colocar outra no lugar. Aqui, isso não rolou. Impossível ousar alterar um setlist coeso como esse, composto unicamente por pedradas, seja a nova “Disruptor”, as intermediárias “Dieletric”, as clássicas “Zero Signal” (que Cazares explicou ter feito parte da trilha sonora do jogo Mortal Kombat) e “Replica” – ambas do consagrado Demanufacture – e até as jurássicas “Martyr” e “Scapegoat”.

O bloco intermediário com as pula-pula “Linchpin” e “What Will Become” e a densa e viajada “Descent” também foi estelar. O encerramento com a etérea “Resurrection”, cravando 1h20 de performance, foi a responsável por motivar qualquer dos presentes a assinalar essa experiência como um dos melhores shows de 2023. Eu já tinha coberto uma apresentação do Fear Factory, em 2015, quando apresentaram o Demanufacture na íntegra e outros hits, quando estavam em grande momento e ainda com Burton, embalados pelo sucesso de Genexus. Este show de 2023 ganhou, e de goleada.
Repertório
Shock
Edgecrusher
Recharger
Dielectric
Soul Hacker
Powershifter
Disruptor
Linchpin
Descent
What Will Become?
Archetype
Demanufacture
Zero Signal
Replica
Martyr
Scapegoat
Resurrection

Bandas de abertura
Após o set do Skin Culture, que não vi, pois ainda estava na estrada, subiu ao palco o Korzus. Com um repertório enxuto, por ser um ato de abertura, abriram com gás total com a clássica “Guilty Silence”, do seu melhor álbum, Ties of Blood (2004); dele, também conferimos a igualmente letal “What Are You Lookin’ For”, e a modernosa “Correria”. A nova “You Can’t Stop Me” mostra Pompeu com uma interpretação vocal muito mais coesa que outrora – a faixa cresce muito ao vivo.
Petardos como “Never Die”, “Discipline of Hate” e “NameSake” mantiveram o nível. Mesmo com o tempo cronometrado, é quase um crime não tocarem “Internally”. Foram tocadas músicas de apenas três álbuns, deixando outros três de fora. De qualquer maneira, um bom aquecimento.
