[Cobertura] Roger Waters deixa público curitibano em um confortável estado letárgico

Roger Waters
04 de novembro de 2023
Ligga Arena
Curitiba/PR

Por Clovis Roman e Kenia Cordeiro

A primeira passagem de Roger Waters por Curitiba foi em 2018. Na ocasião, era véspera de eleição, aquela mesma que teve um trágico resultado. O Acesso Music esteve presente e você pode relembrar aqui nossa matéria. O clima tenso, regado a xingamentos, vaias ao artista e até mesmo ao coral de crianças que participou de The Wall e o êxodo do público após descobrirem que o Roger Waters falava de política nas músicas, criou um clima tenso. Dessa vez, todavia, a harmonia estava no ar. Alguns desavisados sempre aparecem, mas no geral, o lendário ex-integrante do Pink Floyd tocou para o seu próprio público, não para espúrios ignorantes.

A produção, mais uma vez imensa, trouxe quatro telões nababescos, que durante toda a noite, mostraram imagens psicodélicas, outras ligadas às músicas em meio a cenas de Waters em ação. Em sua provável última turnê, ele trouxe um repertório bem diferente daquele de cinco anos atrás. Foram 10 músicas diferentes, com uma visível mudança na quantidade de músicas do álbum solo Is This the Life We Really Want?. Se em 2018, foram sete, dessa vez apenas duas: “Deja Vu” e a faixa-título, ausente outrora. Isso abriu espaço para outros trabalhos solo do artista, outrora obliterados. Waters resgatou duas pérolas dos pouco comentados Radio KAOS (1987) e Amused to Death (1992), respectivamente, a hipnótica e datada “The Powers That Be” (que nem single foi) e a explendorosa “The Bravery of Being out of Range”, que deleitou poucos afortunados.

O Pink Floyd foi – e não poderia deixar de ser diferente – o grande tema do concerto. Foram 17 músicas de diversos trabalhos, mesmo que a abertura, “Confortably Numb”, tenha sido executada em sua versão Lockdown, bem mais soturna e sem o solo de David Gilmour. Diferente, curioso, ousado. Todavia, na hora dos versos “There is no pain you are receding, a distant ship smoke on the horizon, you are only coming through in waves, your lips move but I can’t hear what you’re saying”, não tem como não se emocionar, afinal, é uma das mais belas melodias de todos os tempos.

Outros grandes hits, esses mais próximos das originais, e que levantaram o público foram “Another Brick in the Wall” (partes 2 e 3) e “Wish You Were Here”, antecedida por uma explicação de Waters de como ele e Syd Barret fundaram o Pink Floyd em meados dos anos 1960. Nela, assim como em vários outros momentos, apareceram fotos dos primórdios do Pink Floyd. Em nenhum deles, Gilmour foi visto. Outra que enfeitiçou o público foi “Money” (dona de uma linha de baixo absurda, cantada pelo guitarrista Dave Kilminster), e “Sheep”, com o adendo visual de uma ovelha inflável gigante que circulou todo o estádio. No telão, não apenas ovelhas , mas também bebês, gafanhotos, torradeiras e cachorros, pintaram um cenário psicodélico. O tema lírico, fantástico, com referências a “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell, versa sobre as ovelhas, animais passivos, se revoltam contra os cachorros e os destroem. A Obra de Waters como um todo deve ser absorvida por quem é apaixonado por música.

O show, com pontualidade britânica, teve um público bem menor que da outra vez. No quesito experiência, foi melhor, pois os que estiveram presentes – e veja bem, era muita gente, em todo caso – foram dispostos a entrar em uma imersão musical majestosa. “The Wall” foi um vértice de insanidade, assim como a belíssima balada “Wish You Were Here”, a sorumbática “Us and Them” e a dobradinha apoteótica “Brain Damage” e “Eclipse”, encerramento do perfeito – e mais vendido disco de rock do universo – The Dark Side of the Moon.

Muito se fala de Pink Floyd, com toda justiça, mas pouca da obra de Roger Waters após ele ter deixado o grupo, no começo dos anos 1980. Como frisei acima, toda a obra do músico de 81 anos merece uma atenção maior. Afortunados são aqueles que o fizeram, e ainda mais, dos que estiveram nessa noite espetacular em Curitiba. Aos arrependidos por terem ficado em casa, resta a cruel sentença: Nunca mais.

Repertório:
Confortably Numb
The Happiest Days of Our Lives
Another Brick in the Wall, Part 2
Another Brick in the Wall, Part 3
The Powers That Be
The Bravery of Being Out of Range
The Bar
Have a Cigar
Wish You Were Here
Shine On You Crazy Diamond (Parts VI-VII, V)
Sheep

In the Flesh
Run Like Hell
Déjà Vu
Déjà Vu (Reprise)
Is This the Life We Really Want?
Money
Us and Them
Any Colour You Like
Brain Damage
Eclipse
Two Suns in the Sunset
The Bar (Reprise)
Outside the Wall

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