Por Luís S. Bocatios
Chega aos cinemas brasileiros nesta quinta (27) o filme Um Completo Desconhecido, que conta a história dos primeiros anos da carreira de Bob Dylan, até a famigerada edição de 1965 do Newport Folk Festival, quando o compositor foi vaiado por abandonar o formato acústico, mesmo performando algumas das músicas mais brilhantes de todos os tempos.
O filme foi indicado a oito categorias no Oscar 2025, incluindo Melhor Filme, Melhor Ator (Timothee Chalamet), Melhor Atriz Coadjuvante (Monica Barbaro), Melhor Ator Coadjuvante (Edward Norton) e Melhor Roteiro Adaptado. Com a vitória no prêmio do Sindicato dos Atores (SAG), Chalamet despontou como o favorito para vencer o prêmio, cuja cerimônia de entrega ocorre neste domingo (2 de março).
Verdade seja dita: cinematograficamente, o filme não é lá grandes coisas. O talentoso cineasta James Mangold tem em seu currículo ótimos filmes, como Logan (2017), Ford vs Ferrari (2019) e Johnny & June (2005), a ótima cinebiografia do ícone do country Johnny Cash. O diretor sabe como conduzir uma narrativa clássica, sem desafiar o espectador em nenhum sentido, mas será que essa é a melhor forma de retratar um dos artistas mais disruptivos de sua geração?
Ao contrário do protagonista, o filme não ousa em absolutamente nenhum aspecto e falha ao retratar Dylan de forma unidimensional. Não que Chalamet faça um mau trabalho, mas sua performance passa o filme inteiro na mesma nota, o que é um problema mais de roteiro e direção do que da atuação em si.
Nos poucos momentos em que o filme tenta ir mais a fundo na personalidade de qualquer personagem, esbarra em diálogos mal escritos e mal conduzidos (um diálogo sobre um prato é especialmente constrangedor). Em um momento de vulnerabilidade em que Dylan visita a casa de uma ex-namorada, o personagem se mostra decepcionado pelo fato de que as pessoas pouco se interessam por quem ele é, mas apenas por suas músicas. Ironicamente, o filme faz exatamente a mesma coisa.
Um dos piores aspectos do longa é como ele faz parecer que a evolução artística de Dylan se deu apenas por uma rebeldia um tanto quanto vazia, como em um diálogo no qual o compositor reclama sobre ter que cumprir as expectativas das pessoas, e, quando perguntado sobre o que ele gostaria de fazer, responde “qualquer coisa que eles não queiram”.
Todos os momentos mais interessantes do filme são sobre a complexa relação do compositor com Joan Baez, que ascendeu à fama junto com ele e é interpretada pela excelente Monica Barbaro. Mesmo que Baez também seja retratada de forma unidimensional, a composição da atriz consegue tornar a personagem e sua relação com Dylan muito interessantes e com mais camadas do que o restante da obra.
Outros atores excelentes que parecem não ter tanto para trabalhar são Elle Fanning, que faz muito com pouco, e o maravilhoso Edward Norton, que interpreta uma figura dúbia na vida de Dylan, mas parece estar sempre coberto de boas intenções.
O que o filme faz bem é retratar a transição do compositor de sua fase acústica para a elétrica, se tornando um documento relevante para os fãs de música que desejam entender as implicações que isso teve na carreira de Dylan, que se tornou um “traidor” para muitos fãs de folk e ouviu gritos de “Judas!” na primeira vez que apresentou ao vivo a música mais icônica de sua carreira, “Like a Rolling Stone”.
Além disso, há de se reconhecer que todos os momentos musicais do filme são excelentes, destacando-se aquele no qual Dylan invade um programa de televisão e faz uma jam com um músico de blues, e, especialmente, a maravilhosa encenação da primeira performance pública de “The Times They Are A-Changin”, uma das canções mais lindas e significativas da história da música norte-americana que se tornou icônica por conseguir capturar perfeitamente o espírito de mudança que pairava no ar.
Em resumo, Um Completo Desconhecido é um filme extremamente falho na forma burocrática que adota para contar a história de alguém tão inovador quanto Dylan e no jeito unidimensional e superficial com o qual retrata o protagonista, mas é um bom documento histórico para os fãs de música que se interessam pela história de um dos artistas mais importantes de todos os tempos.
Para aqueles que desejam conhecer mais sobre a personalidade complexa de Bob Dylan, fica a recomendação do ótimo Não Estou Lá (2007), dirigido por Todd Haynes, que ousa na forma cinematográfica e conta com cinco atores e uma atriz interpretando as diferentes facetas do compositor, oferecendo um retrato melhor de sua complexidade.
Foto: Divulgação/Searchlight Pictures

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