Rebaelliun, Cemitério, Cülpado, Podridão, Luciferiano, Matadör, Humanal
18 de fevereiro de 2023
Basement Cultural
Curitiba/PR
Por Clovis Roman
O Extreme Metal Carnival é uma iniciativa que nasceu para ficar. O primeiro dia da primeira edição teve como destaques positivos a qualidade de som para o público e o espaço amplo organizado no lado de fora, com opções de alimentação, bebidas e merchandising generoso, que afetou o bolso deste redator de maneira impiedosa.
A pontualidade, em geral, foi outro fator importante. Chegamos às 17h, e neste mesmo exato minuto, o evento teve início com o Humanal, que apresenta um híbrido de thrash e prog bastante moderno, com os vocais versáteis de Tati Klingel, referência do vocal gutural. Mas ela não atuou apenas nesta seara. Em canções como “Vanity” e “Blindness”, houve a inserção de versos limpos, e principalmente na segunda, a interpretação vocal ultrapassou as raias da perfeição. A frontgirl ainda adicionou batidas primitivas com o uso de um tambor. O grupo mesclou músicas mais rápidas e agressivas com sons mais cadenciados, mas ainda brutos, como “Routine Machine”. O show foi encerrado com a torta “Guilt”, e tiraram “A Resistência” do set por questões de tempo de palco. O começo do festival foi em grande estilo.
Banda mais nova no cenário metal de Curitiba, o Matadör surgiu em 2020, e hoje é como uma one-man-band, liderada pelo guitarrista e vocalista Victor Camilo. A banda que teve ao seu lado contou com o exímio guitarrista Lucas Licheski (Hell Gun), o baixista Isaac Murilo (guitarrista da Hell Gun, ex-Porrada) e o baterista Victor Hugo (Böriz Kasööy, ex-Alcoholic War e Defunto). O repertório foi espantosamente curto, mas foi matador enquanto durou (trocadilho inevitável). Abriram com “Aeternus Lupus”, “Bloodspell” e “Satanic Tyrant”, estas que só podem ser ouvidas por quem for ao show do grupo. A última foi “Funeral Desecrator”, lançada como single nas plataformas digitais e uma espécie de clássico do jovem conjunto. Um álbum deve ver a luz do dia em breve, quiçá ainda este ano.
O Luciferiano apresentou um black metal que não se apoia apenas em riffs abelhudos e velocidade caótica, afinal, há muito de doom e heavy metal nas composições do quarteto catarinense. Hinos agonizantes como “Voluptuosa Rainha dos Meus Sonhos” (do álbum Opositor, 2013) e “Rebelião” (esta ainda não lançada oficialmente em disco) tem foco nas partes cadenciadas, lentas, assassinas, com vocal extremamente rasgado. Este último elemento é padrão em todas as músicas, e passa uma áura de agonia vibrante. Mais para o fim do set, tivemos momentos mais velozes, nas quais as influências heavy se fizeram mais presentes, como em “O Guerreiro de Mim”, que a mescla com blast beats, e “A Face do Cão”. A saideira foi “A Glória de Gabriel” (do debut A Face do Cão, 2006), com algumas passagens instrumentais bem legais e letra bastante profana, como manda a cartilha do black metal.
A iluminação diminuiu consideravelmente quando o Podridão começou seu set. Na penumbra, o trio paulista desandou em tocar músicas brutais, calcadas no death metal. O grupo de Itaquaquecetuba tem dois álbuns lançados, Podridão (2017) e Revering the Unearthed Corpse (2020). As músicas são curtas, com letras sobre morte, sangue e anti-religião, o que é sempre bem-vindo neste cenário. Durante o set, se destacou a fúria da banda no palco e o estilo rústico do baterista Repugnant Fat. Eu já tinha visto um show dos caras ano passado, em Poá/SP, mas o som magro naquele evento depôs contra. Aqui, com um equipamento mais robusto e técnico de som experiente, a massa sonora do Podridão soou ainda mais podre (no bom sentido).
Outra one-man-band que conta com uma formação para se apresentar ao vivo é o Cülpado, liderado pelo exímio baterista Jeff Verdani (Sad Theory, Jailor, Murdeath, entre outros). Todavia, aqui o músico cuida do baixo e vocal, tendo ao seu lado o guitarrista Kevin Vieira (Exylle, Repudiyo e ex-live member do Matadör) para as guitarras e o rústico baterista Allan Carvalho. A cada show que passa a performance do trio fica mais entrosada, com uma execução soberba dos músicos. Tudo bem, teve uma atravessadinha no meio da gloriosa “Pipoca, Sangue e Pólvora” (um épico nada pomposo, com riffs matadores, partes cadenciadas e rápidas se revezando), mas passou batido pelo público. O som teve alguns problemas no começo, em “Mato por Prazer”, devido a um mau contato no cabo da guitarra, mas logo o crew resolveu a questão e a apresentação primorosa do Cülpado seguiu sem maiores imprevistos. Verdani está cada vez mais a vontade como vocalista e baixista, atuando como um genuíno frontman, instigando o público e apresentando seus colegas em determinados momentos durante as músicas.
Leia aqui nossa resenha de Romper da Realidade, álbum do Cülpado. https://acessomusic.com.br/2022/06/03/resenha-culpado-romper-da-realidade/
O trio Cemitério era outro que eu precisava ver em um show com boa qualidade de som. Vi os caras ano passado em São Paulo, quando tocaram com Andralls, Manger Cadavre? e Gangrena Gasosa, mas lá os equipamentos soaram estranhos. Aqui, o som alto e definido, com o baixo aparecendo ativamente, permitiu a mim e à todos abrir rodas de quebração ao som de petardos como “A Vingança de Cropsy”, “A Última Casa a Esquerda” (o rerfão, ao ser ouvido uma vez, não sai mais da cabeça), “Sexta-Feira 13” e “Natal Sangrento”, que a piazada cantou junto com fervor, surpreendendo o baixista e vocalista Hugo Golon. Em meio a outras pérolas, como “Holocausto Canibal” e “Faces de Morte”, que fechou o set, tivemos ainda “Morte Infernal”, que é uma versão em português de “Infernal Death”, do debut do Death, Scream Bloody Gore. “Esta aqui, quem não conhece, é poser”, bradou Golon. Errado não está.
Fechando a noite, o Rebaelliun mostrou uma força e determinação louváveis. Abalados por duas perdas em um intervalo de poucos anos, o grupo gaúcho se reformulou e segue levando seu brutal death metal aos diversos cantos do Brasil com muita garra. Em 2018, Fabiano Penna (que também havia tocado no fantástico The Ordher), faleceu em decorrência de uma infecção bacteriana adquirida após uma turnê pela Europa. Quatro anos depois, outro duro golpe, com a partida do vocalista e baixista Lohy Silveira, após uma parada cardiorrespiratória. Membro original, o baterista Sandro Moreira seguiu em frente, ao lado de Evandro Passos (que substituiu Penna) e o novo integrante Bruno Añaña, comandando baixo e vocal com muita garra e respeitando o legado de 25 anos deste gigante do death metal brasileiro. O músico toca também no Postmorten Inc, que toca no segundo dia do Extreme Metal Carnival. No repertório, uma música (“Rebaelliun”) do último disco, o já distante The Hell’s Decrees, lançado há sete anos, além de material mais antigo, dos clássicos Burn the Promisse Land (“At War” e “Spawning the Rebellion”), Annihilation (faixa-título) e do EP Bringer of War (“The Last Stand” e “War Cult Anthem”). Ainda tivemos espaço para duas músicas ainda não gravadas em estúdio, “The Messiah” e “All Hail the Regicide”, e covers para “Day of Suffering” (Morbid Angel) e “Witches’ Sabbath”, do Vulcano. O show foi uma porrada sem precedentes, como esperado para uma banda com discografia tão sólida. Que venham novos álbuns e turnês em diversos territórios.
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